Poesia Urbana
Poemas e Poesias

Poesia Urbana


Proibido para pessoas com muito pudor xD Não sou muito de escrever contos, mas gosto muito de ler. Acho que precisava escrever isso pra cessar essa louca que insiste em gritar dentro de mim...

Poesia Urbana


Eu caminhava preguiçosamente pela calçada escura do centro da cidade, chutando uma pedrinha aqui, outra acolá. Voando alto nos meus pensamentos de solidão, enquanto dezenas de putas berravam e gargalhavam à procura de fregueses, bêbadas, trôpegas, nas portas. Acompanhadas. Íamos eu e minha caixa de cerveja, bem unidas, pra casa, para termos uma a outra a noite inteira. Sempre fui fraca pra bebida, sempre fui a primeira a vomitar, sempre fui a primeira a dar vexame, a dançar sem blusa em cima da mesa em alguma festa da faculdade. E nunca liguei.
E eu pensava exatamente “Nele” quando uma gargalhada me atingiu. Encheu meus ouvidos com o som tão familiar, mas tão estranho. Tão longe, perdido nos anos passados. Foi como de repente mergulhar num mar de gelo e sentir o eriçar de cada pêlo do corpo. Era Dele. Eu sabia. Uma dor aguda me passou pelo corpo, seguida de torpor intenso. Pensei que fosse desmaiar, pensei que minhas pernas não me sustentariam. Eu podia ouvi-lo, mas onde estaria? Será que poderia vê-lo também? Ansiedade, mágoa, angústia, prazer dominaram minha alma. Me vi de repente procurando avidamente, farejando como um cão à procura de comida. Acho até que mostrei meus caninos ameaçadoramente pras prostitutas dos bordéis. Eu tinha que achá-lo. Eu o sentia tão perto.
         Senti meu coração acelerar e levantei os olhos, ainda farejando o ar. Nosso olhar se encontrou. O riso dele sumiu, e sua boca, cheia de batom, se firmou num gesto vesgo de horror. Eu o vira. Ele me viu. Acho que me paralisei por alguns segundos. Ele me olhava fixamente e eu não podia acreditar no que via. Circundando os olhos oblíquos, muito verdes, minhas azeitonas, como eu costumava brincar, havia um grosso traçado preto. Primeiro pensei que fosse uma marca de soco, mas só então me dei conta, que além do traçado preto e do batom, também havia sombras cor de rosa. E blush. Muito blush barato. Desci meus olhos por seu corpo, tão antes desejado por mim, e vi que em seu tórax ele agora ostentava um soutien. Um soutien que estava dentro de uma blusa que deixava à mostra sua barriga, lisinha, como eu sempre gostei. E ainda havia uma saia. E uma meia arrastão, que terminavam em botas de cano alto, no maior estilo “Paquita”. Comprovei que “ele” tinha se tornado “ela”. Uma puta da zona. Ali, bem ali, na minha frente.
         Senti vontade de vomitar pelo choque que tive. Como ele pôde fazer isso comigo? Esquadrinhei seu corpo e ainda o vi ali, tímido e escondido, mas vi. Ele tentou se esconder, pôs as mãos sobre os seios que não passavam de química. Arregalou seus olhos muito verdes e trancou a boca. Vi seus olhos encherem de lagrimas. Ele tinha vergonha. De repente ele começou a correr na direção oposta, fugir de mim, e eu podia ouvir seu choro, seus soluços entrecortados pelo vento. Eu, que antes sempre o protegera, que o desejara tanto e demasiadamente, que para estar junto assumira quase o papel de mãe, era o lobo que corria pela escuridão atrás da lebre.
         Virou a esquina num beco e parou na boca do lixo, nos restos de comida que algum restaurante abandonou. Sem ter como correr, me encarou, e eu vi fúria nos seus olhos, vi uma chama vermelha e quente, que me consumia, que sempre me consumiu. Ele me culpava, ele me odiava, por me amar demais, por amá-lo demais. Eu o odiava por ser o filho da puta que foi. E eu o amava por ser justamente esse filho da puta. Nosso relacionamento teve o seu fim antes mesmo de começar. Eu sempre o amei, como homem, ele nunca me amou, como mulher, ele nunca me contou sobre a sua homossexualidade, ele me enganou, me iludiu. Me fez crer no futuro, e de repente sumiu, amassando meu ideal de felicidade ao lado dele.
         Seus olhos quentes e verdes lançaram chamas em mim. Aquilo me doeu, me cortou a alma. Eu, vitima, sendo condenada por tudo, por algo que jamais fiz. Ouvi sua voz rouca gritando que a culpa era minha. Ouvi seu uivo de lobo, e de repente a lebre era eu. Recuei contra sua investida, senti a parede em minhas costas. Ele avançou como um monstro em cima de mim. Senti seu hálito de cachaça perto de meu nariz. Senti o cheiro das ervas que ele tinha fumado. Gotículas de sua saliva encontravam meu rosto púrpura de ódio, de medo. De repente vi seu peito arfar debaixo da blusa de oncinha, sua respiração era ofegante, eu acabara de ouvir os maiores desaforos do mundo, culpada de um crime que nunca cometi. Eu era a vítima, eu fui abandonada sem explicação nenhuma. E dentro de mim algo aflorou. Acho que raiva e mágoa não formam uma boa mistura quando se encontram dentro do peito.
         Eu senti o desejo me dominar, e então, o beijei. Ferozmente. Foi uma explosão de línguas e salivas e dentes e bocas. Eu o amava ainda, ardentemente, intensamente, odiosamente. Nos afastamos. Me virei e segui meu caminho, com minhas cervejas nas mãos trêmulas. Sentindo o coração pesar dentro do peito, querendo me enfiar debaixo do primeiro caminhão que passasse. As imagens ainda giravam desconexas dentro da minha cabeça. Nada fazia sentido. Ele era meu, ele tinha que ser, eu sempre o quis, sempre o desejei mais do que qualquer outro ou outra. Meu homem decidiu virar mulher. E agora eu sabia. Travamos uma batalha em plena rua. E na nossa guerra de corpos, me roubou duas latinhas de Bohemia. Maldito! Maldito Filho da Puta!


"Sei lá, sei lá, a vida é uma grande ilusão..."





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