Dona Célia
Poemas e Poesias

Dona Célia


Conheci dona Célia no trabalho. Era diarista e ia dar uma geral na empresa de 15 em 15 dias. Eu já trabalhava lá quando entrou. Miúda, meio encurvada, como se estivesse se escondendo do mundo. Falava baixo, como um sussuro, com medo de incomodar as pessoas. Andava leve também, pra não atormentar ninguém. Creio que se pudesse, seria uma sombra, dessas que a gente nem percebe, opaca. Seria invisível se não fosse o seu grande esforço para ser invisível.
Eu gostava dela. Simplesmente gostava, sem motivos aparentes. Não falava muito com ninguém, era sempre muito calada, na verdade, mas me batia uma grande alegria no peito quando eu via dona Célia entrando com seus panos e seus pertences, e com sua bolsa barata de pano. Ela despertava em mim uma curiosidade de conhecê-la, de adentrar o seu mundinho restrito, de saber como são as coisas simples da vida. Eu sempre trabalhava muito, não tinha muito tempo pro mundo, exceto pra explorar o mundo de dona Célia.
Lembro-me da primeira vez em que falou comigo. Seus olhos baixos, sua postura meio enclinada, sua fala leve, quase um sussuro, me entregando R$5,00 pra eu comprar o seu almoço. Fiquei comovida. Tive certeza de que confiava em mim naquele momento, essa era a sua maneira de demonstrar. Tanto que fiquei meio sem jeito de falar que o dinheiro não era o suficiente. Acabei pagando do meu bolso. E com prazer.
Aos poucos foi se abrindo, se mostrando. Não mudou o jeito tímido de ser. A qualquer pedido acanhado de ajuda para remover uma máquina de lugar ou posicionar a escada em algum canto, sempre dizia: "Deus te abençoe!" E eu sentia mesmo que ele iria me abençoar. Descobri que morava numa casinha humilde num dos muitos bairros humildes do suburbio da cidade. Não tinha filhos. Vivia só, com o marido, igualmente acanhado e encurvado. Gostava de ver o especial do Roberto no fim de ano, e vivia escutando músicas dele e de outros bonitões do passado no seu microsystem, comprado em 6 prestações nas Casas Bahia. Comia pouco, bebia uma cervejinha no final do dia, ao lado do seu homem. Vivia pouco, assim quase superficialmente, mas no seu mundo, era muito. Vez ou outra fazia uma extravagância e levava umas fatias de queijo pra casa, pra comer com o pão com manteiga de todo dia. Ralava de sol a sol, limpando casas, escritórios, prédios e corações. Pra mim, sua maior qualidade não estava na coragem de encarar sozinha um andar inteiro pra limpar, fosse sábado, domingo e feriado, mas sim na pureza quase infantil com que olhava alguns olhos, purificando almas. Os meus olhos eram um par dos poucos privilegiados por sua escolha. Não há como negar que era uma guerreira, em ambos os mundos.
Acho impressionante como as pessoas conseguem mudar a vida das outras assim, mesmo sem querer. Basta um cruzar de olhares, ou um roçar de mãos. Não precisa muito para se tornar especial. Às vezes uma conversa significa mais do que anos de convivência. Impressionante como Dona Célia mudou minha vida e eu nem mesmo sei dizer o porque de tamanha admiração que sinto. Só sei que hoje, mesmo tempos depois de tudo, ainda guardo um carinho enorme por ela no peito e tenho a certeza de ouvi-la dizer a todo momento: "Deus te abençoe"... ao que intimamente, respondo "a ti também..."


"Sou uma gota d'água, sou um grão de areia"



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