ANALOGIA
(André L. Soares – 28.10.06 – Brasília/DF)
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Faz tempo, procuro a analogia material para o amor. Um produto que seja unânime ou que, ao vê-lo, poucos resistam. Um objeto de desejo quando se está ainda nas idades mais puras e, também (embora com mais cautela), nas demais faixas etárias. Buscava o símbolo doce, alegre, colorido, leve, gostoso, aromatizado e, de certa forma, nem caro nem barato. Não que o amor seja comprado. Mas, sabe-se, amar não é gratuito. Do mesmo modo, tal representação não poderia ser abundante, nem escassa. Seria algo não consumido em demasia, tampouco sofresse escassez. E se o amor começa no olhar e no beijo, haveria de ‘encher os olhos’ e, despertar a gula, passando obrigatoriamente pelos lábios. Porque amor é alimento. Engorda ou emagrece, face a correspondência ou o metabolismo de cada um. Esses caracteres teriam que constar dessa simbologia. Entendi que, se os excessivamente vaidosos e egoístas têm dificuldade de amar além de si, haveriam, talvez por estética, de resistir ao produto, o qual possuiria, ainda, sutil relação com a sexualidade. Percebi que se tratava de guloseima que, ao se degustar, faz-se com calma, olhos quase fechados, chegando-se a gemer baixinho e, ao final, querendo mais. Um produto assim seria encontrado em shoppings. Porque o amor é de fácil acesso. Fui até uma ‘praça de alimentação’. Não tardei a reconhecer o que procurava. Defini o amor, então, na concepção mais capitalista da palavra sem, contudo, deixar de ser um deleite: o sabor é chocolate; o nome, ‘milk shake’. Muitos dirão ser errada a analogia, pois o amor é ‘quente’ e o produto mencionado é ‘frio’. Mas não. Sem amor, somos quase sempre frios e secos: falsos e ridículos ‘bacantes’, embebidos de vil alegria. No entanto, o corpo vive a quebra do gelo e se derrete de verdade, somente após o entrelace frenético das línguas.
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